22/03/2019
EDUARDO AMORIM E MAURÍLIO BIAGI FILHO
Nos últimos anos, impulsionada pela deflagração da primeira fase da Operação Lava Jato em março de 2014, a sociedade brasileira vivencia experiências inéditas de um sistemático, ágil e eficaz desmantelamento de esquemas criminosos alimentados com dinheiro público.
Inadmissível, portanto, aceitar retrocessos que impeçam o avanço do saneamento das estruturas que gerenciam os recursos recolhidos da sociedade civil. E que, para ela, deveriam ser devolvidos na forma de serviços públicos de qualidade.
Antes da Lava Jato, os mecanismos de combate e repressão à corrupção até conseguiam desnudar malfeitos e malfeitores, mas raramente galgavam resultados imediatos. Ou, ainda, eram desidratados no decorrer do percurso, como ocorreu com as operações Satiagraha e Castelo de Areia.
A partir da excelência investigativa do Ministério Público e Polícia Federal, do respaldo fornecido pelo Judiciário e legislação (em especial a regulamentação da colaboração premiada em 2013) e do apoio ativo da sociedade civil, pela primeira vez na história recente estruturas sólidas de corrupção ruíram. E seus protagonistas, inclusive os de considerável poderio político, foram punidos.
O caminho desejável e esperado seria o de avançar, principalmente por meio de mudanças legislativas que tornem estrutural a prevenção e combate a malfeitos, e não dependente de ações pontuais.
Nesse contexto, o Instituto Ribeirão 2030 vê com receio os desdobramentos que possam vir da recente decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de que crimes como corrupção e lavagem de dinheiro, quando investigados junto com caixa dois, devam tramitar na Justiça Eleitoral.
Há riscos reais de que essa interpretação acarrete em impunidade, em um inadmissível retrocesso das conquistas dos últimos anos.
Se fosse deflagrada hoje, tendo em vista a decisão do STF, a Operação Sevandija poderia ter seu poder de fogo abalado.
Fruto do esforço da PF e Gaeco, que desbarataram o maior esquema de corrupção já conhecido em Ribeirão Preto, com mais de R$ 200 milhões em contratos e repasses considerados mancomunados, a Sevandija resvalou diretamente no entrelaçamento da corrupção com crimes eleitorais.
Afinal, um dos esquemas envolvia o uso de terceirizados apadrinhados por vereadores e agentes políticos para reforço em campanhas eleitorais.
Não à toa, no decorrer do processo alguns réus tentaram, por todos os meios, diminuir o alcance das imputações ao colocá-las apenas sob a guarda da Justiça Eleitoral.
Não tiveram sucesso. Mediante, ressalta-se, esforço do Gaeco em argumentar em sentido contrário, já sabendo dos riscos de um eventual deslocamento. Até por isso, os promotores de Justiça se anteciparam e encaminharam, logo de início, para a Justiça Eleitoral os crimes diretamente a ela relacionados para que não houvesse conflito.
Corrupção não é um crime de baixo potencial ofensivo. O desvio de dinheiro público mata. Assassina desde pacientes que padecem nas filas intermináveis do SUS até o futuro de crianças que sofrem com o aprendizado inadequado nas escolas públicas.
Assim sendo, o Instituto Ribeirão 2030 defende o avanço de medidas estruturais que combatam desvios e reduzam a impunidade. Respeitando, sempre, os devidos processos legais, o contraditório e a presunção de inocência.
Imperativa, principalmente, a necessidade de adequações na legislação. Estudo coordenado pela FGV e Transparência Internacional, intitulado “Novas Medidas de Combate à Corrupção”, aponta 70 sugestões de aprimoramentos.
Entre elas a criminalização do Caixa 2 e a extinção da competência criminal da Justiça Eleitoral.
Algumas dessas propostas já foram apresentadas pelo atual ministro da Justiça, Sérgio Moro.
Só poderão avançar, porém, com apoio da sociedade civil. Mais do que nunca, nosso engajamento se faz necessário.
Eduardo Amorim e Maurílio Biagi Filho, presidente e vice-presidente do Instituto Ribeirão 2030
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